Política – O mandato coletivo e suas polêmicas.

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Por Diana Câmara.
No Brasil, desde as eleições de 2016 é possível observar um movimento
no sentido de instituir na prática de “mandato coletivo”. Em uma
candidatura coletiva supostamente estão reunidas diversas pessoas com
conhecimento e experiência em áreas específicas, pertencentes a
diferentes setores sociais e, por vezes, filiadas a partidos políticos
distintos ou sequer filiadas.

Os defensores deste formato pregam que sua
missão é assumir o compromisso de ser um canal direto de intervenção da
sociedade no poder público, de forma a somarem suas capacidades em
áreas particulares e contribuírem na cocriação de projetos e na gestão
da governança, agregando ao mandato múltiplas perspectivas.


Por outro lado, vale registrar: as candidaturas coletivas são um
instituto novo que não têm legislação que as regule ou sequer que
reconheça a possibilidade de sua prática, havendo muitos pontos para
discussões futuras, inclusive para impugnação de pedido de registro de
candidatura de mandato coletivo. A alegação, por exemplo, pode ser
quebra da isonomia entre os candidatos (por vários candidatos terem
supostamente mais poder de campanha do que um só); estelionato eleitoral
(visto que o eleitor pode ser enganado pensando que está votando em uma
pessoa, mas na verdade ser outra); não preenchimento das condições de
elegibilidade ou incurso em alguma das causas de inelegibilidade (se
algum dos cocandidatos, como se apresentam, não preenchem os requisitos,
como, por exemplo, não ter idade mínima ou ser ficha suja); a vedação
de coligação para proporcionais (no caso dos cocandidatos ter filiação
partidária diversa); e o fato de ser, na prática, uma minichapa, ou
seja, uma chapa dentro de uma chapa, e não uma candidatura única
(ferindo o princípio da individualidade do voto).


Nas eleições de 2018, tem-se conhecimento de que a Justiça Eleitoral
permitiu o registro de pelo menos nove candidaturas coletivas, formadas
por grupos de pessoas que se uniram para concorrer a uma única vaga no
Legislativo e defendem renovação política e maior participação popular. A
ideia é que, ao votar em um, o eleitor possa eleger três, quatro ou até
mais representantes e que, assim, conquistem um espaço no Congresso
Nacional ou nas Assembleias Legislativas. Neste pleito, tem-se notícia
de que houve candidaturas coletivas em São Paulo, Mato Grosso do Sul,
Paraná, Pernambuco e Distrito Federal.


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Diversas lograram êxito e conquistaram um assento no legislativo
estadual, como, por exemplo, em São Paulo e Pernambuco. O primeiro
Mandato Coletivo em São Paulo foi conquistado pela Bancada Ativista,
representada nas eleições pela jornalista Mônica Seixas (PSOL). O grupo
recebeu 149.844 votos na urna e foi a 10° candidatura mais votada em São
Paulo para a Assembleia Legislativa. Em Pernambuco, outro grupo de
cinco mulheres filiadas ao PSOL se candidatou sob o codinome “Juntas” e
foi eleito com 39.175 votos. À época elas divulgaram que pretendiam
dividir, além do gabinete e das decisões políticas, a remuneração e os
benefícios financeiros e se auto intitularam “codeputadas”.

Todavia, na prática, num mandato coletivo apenas uma pessoa do grupo é
tida como representante oficial, podendo ser eleita e vindo a se tornar
membro do legislativo, sendo responsável por participar das votações e
da tomada de decisões. Vale registrar que o nome na urna pode até
constar como “mandato coletivo” ou outro pseudônimo que represente o
grupo, porém só uma pessoa está registrada. Sendo assim, só um
componente será o titular e, vencendo, será diplomado e irá receber a
posse. Em uma candidatura com quatro pessoas, três não poderão entrar na
Câmara ou na Assembleia como autoridade, não terão direito a falar na
tribuna, não poderão votar ou propor projetos de lei e não terão
gabinetes próprios. Assim, apenas um titular tem legitimidade e não pode
ser substituído pelos demais se faltar às sessões. 



Os demais nomes podem ser nomeados dentro do gabinete, sendo algo
decidido internamente pelo titular e demais integrantes do projeto. No
caso de eventuais desavenças com o eleito, não há nenhuma proteção
jurídica para os demais membros prevista na legislação ou jurisprudência
que assegurem sua permanência no gabinete.


Como pudemos verificar, o instrumento é novo e passível de diversos
questionamentos. Há muitas teses a serem levantas, por candidato,
partido político adversário ou Ministério Público Eleitoral, e quando
enfrentadas pelo Judiciário Eleitoral, podem levar ao indeferimento do
registro de candidatura.

*Advogada especialista em Direito Eleitoral, presidente da
Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PE, membro fundadora e
ex-presidente do Instituto de Direito Eleitoral e Público de Pernambuco
(IDEPPE), membro fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e
Político (ABRADEP) e autora de livros.

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